sábado, 3 de dezembro de 2011

Noção de espaço

Eu andando com minha namorada. Ela fala:

- Amor, por aqui é mais perto.
- Não amor, assim fica longe.
- Claro que não - ela responde - seu caminho é muito mais longo.

Nisso, eu falo:

- Amor, eu tenho mais noção espacial do que você.
- Por que você tá dizendo isso?! Só porque eu sou mulher?!
- Não, porque você está demonstrando isso agora.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Esclarecimento

Como eu falei no texto original e repeti várias vezes e muitos não viram, repito: NÃO defendo o Júlio. Foi um idiota! Não concordo com o que ele disse. Amo meu estado. Mas acho que a população exagerou e esqueceu de ver que ela também faz piadas com os outros. Só isso. Quanto à OAB está cumprindo seu papel. Mas acho que o povo deve pegar mais leve com ele. Linchamento moral e ameaça de morte não resolve nem mostra o povo que somos. Somos melhores que isso.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Xingou meu estado, vou processar

Quero falar sobre um assunto que está acontecendo atualmente e que, para mim, é bastante sintomático. Recentemente, um turista que veio conhecer a Paraíba falou mal, após ver um acidente de caminhão, dizendo que a Paraíba é uma merda e “não venham à Paraíba”. Segue o link do vídeo:

Julio Bambambam flagra acidente de caminhao ao vivo em Joao Pessoa

Foi uma piada engraçada? Não. Mas eu não consigo acreditar nas proporções que as coisas tomam. Ele vai ser processado! O que está acontecendo com o nosso mundo?

Primeiramente, eu disse que achava sintomático e explico o porquê. Para isso, vou usar uma metáfora. Se você chegar a Silvio Santos e disser “pobretão”, qual será a reação dele? Ele vai ignorar. Se você chegar para um cara pobre e disser a mesma coisa, o que ele vai fazer? Alguns vão ignorar, outros vão se ofender. Estes últimos são complexados por serem pobres.

Alguém xingou a Paraíba. E daí? Que autoestima baixa é essa dos meus conterrâneos paraibanos? Se vocês estão tão ofendidos assim, provavelmente, no fundo, acreditam um pouco que a Paraíba seja uma merda! Eu entendo que o paraibano tenha baixa autoestima. Somos alvo de zombaria de muitos lugares do Brasil. Desde os vizinhos do Recife, até os cariocas, paulistas e sulistas. Temos fama de pobres, analfabetos, imigrantes que poluem São Paulo, feios etc. Normal existir baixa autoestima. Mas ficar de coitadinhos, de “ai, doeu o que ele falou”, isso é opção nossa!

Eu não estou nem aí para o que esse cara falou. O que me incomoda mesmo é a reação dos meus conterrâneos. Estamos vivendo em um mundo em que a liberdade de expressão está sendo jogada no lixo. Ele foi inteligente no que falou? Foi gentil? Não! Acho ele um mané. Mas devemos processar? Por favor, gente, que povo mais sensivelzinho.

A liberdade de expressão está sendo podada por pura hipocrisia! Por exemplo, eu sou comediante, me divirto zoando pessoas de outros estados. Que moral eu tenho pra ficar putinho porque falaram mal da Paraíba? “Ah Alyson, mas eu não sou comediante”.

Ok, senhor não-comediante. Você de João Pessoa, quantas vezes não fez piadinhas entre amigos dizendo que Campina Grande é uma merda? Você de Campina, quantas vezes não zoou João Pessoa? Você de Cajazeiras, quantas piadas não fez de Nazarezinho? Você paraibano, quantas vezes não disse que carioca é um bando de maconheiro ou de ladrão? Você brasileiro, quantas vezes não disse que Português é burro e Argentino, filho da puta?

Coloque a mão na sua consciência e se sinta tão mané quanto este cara. Dá licença gente! Xingou a Paraíba? Ok, foda-se. É só mais um que faz isso e que é igualzinho à gente. Estou defendendo o cara? Não! Acho ele um babaca. E é por isso que temos que ficar acima disso.

Em tempo: o cara está sofrendo agora um linchamento moral. A população inteira atacando ele até ele apagar o facebook. Gente chamando de veado e dando o celular dele no twitter. Muita gente mesmo xingando. É assim, senhores paraibanos, que vocês querem provar que não são a merda que ele disse que são?

Em tempo 2: será possível que uma parte do que eu digo está sendo comentada e a outra não? Todos falam da liberdade de expressão. Dizem que vai até o momento em que agride alguém. Ora, agressão moral só o é se você considerar. Se alguém me chamar de filho da puta, tenho duas opções: 1 - ficar ofendido, irritado feito adolescente e reagir; 2 - ignorar, como um adulto, e ficar por cima.

Mas não é nem isso meu principal comentário. O que está estranho é que a maioria fala de liberdade de expressão e ignora (talvez deliberadamente) a parte em que eu digo que ele é igual à gente. Será possível que a hipocrisia é tanta, que a maioria está ignorando o comentário que eu fiz dizendo que aquilo que ele fez, todos nós fazemos toda hora? Há como negar? Quero ouvir comentários sobre isso. O que ele fez, eu não disse que foi certo. Mas ele escancarou o preconceito que todos vocês têm (nós temos), mas falam (falamos) a boca pequena.

Aí alguém me perguntou: se eu posso processar, por que não fazê-lo? Por uma questão de bom senso e honestidade comigo mesmo! Não é porque a lei permite, que eu sou obrigado a fazer.

Tiremos a trave dos nossos olhos antes de olhar o argueiro no olho do outro. Pois infelizmente, nosso lema tem sido: mexeu com os teus, eu rio. Mexeu com os meus, eu chio.



Este texto lembra a temática de um outro texto que já escrevi aqui. Segue o link: Politicamente correto.

Mais um ótimo texto sobre isso é o do meu amigo, mais novo integrante do CQC, Maurício Meirelles. Segue o link:

Pare de se levar tão a sério

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Se não explicamos, não é natural

“Meu pai estava mal, prestes a morrer e, de repente, algo aconteceu e ele ficou bom. Ao perguntar aos médicos, eles disseram que não tinham explicação para o fato. Disseram que a ciência não explicava o que aconteceu. Lógico que foi um milagre de Deus”.

Quantos há que nunca ouviram essa afirmação? Provavelmente todos já ouviram isso e, bem provavelmente, várias vezes na vida. Por outro lado, já ouvimos muitas vezes “esses cientistas ateus são egocêntricos. Acreditam que podem e sabem tudo com sua ciência”. Gostaria de analisar por um outro ângulo a visão do egocentrismo humano.

Qual o papel da ciência?

Precisamos, antes de tudo, entender como o cientista vê a sua ciência. Ela não é infalível, mas é o que o ser humano tem. O que quero dizer com isso? A ciência é uma maneira humana de descobrir o mundo e a nós mesmos. Nem tudo o que está no universo (e muito, muito longe de tudo) está contido na ciência. Porém, tudo o que o homem sabe está na ciência. Assim, confiar na ciência não é achar que podemos saber de tudo, mas saber que teremos acesso a tudo o que o homem descobriu até hoje.

E quando nos deparamos com o inexplicável?

No passado, nossos ancestrais afirmavam que os trovões eram o barulho dos deuses guerreando com seus raios mortais. Até que, um dia, a ciência descobriu como funcionavam os relâmpagos e os consequentes trovões. Alguém ainda acha que é a guerra dos deuses?

O problema (ou não) do ser humano, é que ele é inquieto. Sua inquietação tem um lado bom: ele nunca se satisfaz com o que sabe e quer sempre conhecer mais. Aprendemos sempre coisas novas e sempre estamos fazendo por onde viver melhor com o que sabemos. Mas também existe um lado ruim: quando nos deparamos com o desconhecido, nossa frustração é tanta, que nos recusamos a admitir que desconhecemos. É aí que entra o que eu considero o verdadeiro egocentrismo humano.

“Conhecemos toda a natureza”

Quando o homem se depara com algo que a ciência não explica, ele tem tendência imediata a negar que desconhece a origem do fato. Ele sabe a resposta: foi Deus, foi o sobrenatural, foram os orixás, foram os demônios, foi o espírito do meu pai etc. E a frase é bem recorrente: não há explicação científica, logo, é sobrenatural. Uma pessoa que acredita dessa forma tem muito mais fé na ciência do que qualquer bom cientista.

Qualquer cientista sabe que o que a ciência não explica pode vir um dia a ser explicado ou pode ser que permaneça para sempre desconhecido pelo homem. Mas isso não exclui a possibilidade de o fato ser natural. Quando, cientes de que ciência é conhecimento humano, pronunciamos a frase (ou alguma similar a) “Se a ciência não explica, é porque é sobrenatural”, estamos incorrendo na incrível arrogância de afirmar “tudo o que é natural o homem conhece. Se o homem não sabe, não é natural”. É quase como dizer que o homem conhece 100% da natureza.

O que é o inexplicável?

A ciência não explica tudo. Isso significa que há fenômenos que fogem ao natural? Não, significa que há fenômenos naturais que o homem desconhece e/ou não sabe explicar. A ciência, por mais evoluída que esteja, não dá conta de 1% do universo. Cientistas têm consciência disso. Religiosos que afirmam que o que o homem não explica é sobrenatural, não. Confiam demais na ciência.

Então como posso responder à questão que fiz no subtítulo “o que é o inexplicável”? Simples, eu não posso. Quando somos confrontados por algo que nós não explicamos, existem duas possibilidades: 1) você não sabe o que é aquilo, pode até achar que é sobrenatural, mas já existe algum cientista (ou até milhares) que saberão explicar direitinho o fenômeno; 2) nem você sabe, nem qualquer outra pessoa. Isso significa que o ser humano ainda não chegou a uma resposta (e pode nunca chegar).

Então, quando não sabemos explicar um fenômeno, não significa que ele é sobrenatural, significa que não sabemos explicar um fenômeno. Há coisas no mundo que são consideradas sobrenaturais e a ciência já explica como fenômenos naturais. Há coisas que a ciência ainda não explica ou talvez nunca venha a explicar. E quando alguém me pergunta “Se você não crê em sobrenatural, como você explica o fenômeno tal?”, minha resposta é simples: eu não explico.

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Trollando um mendigo

- Senhor, me dê uma ajudinha... Deus vai te dar em dobro...
- Tem certeza de que Deus me dará em dobro?
- Vai sim senhor...
- Certo... vejamos... se eu te der 8 reais, quanto Deus vai me dar?
- Muito mais, seu dotô!
- Você me deu certeza de que ele me daria em dobro. Quanto vai ser?
- Sei não...
- Como o senhor me promete uma coisa que nem o senhor sabe? O senhor tem que saber defender a sua tese.
- Mas quem ajuda, Deus se lembra depois.
- E se Deus não existir?
- Ele existe!
- Ele é bom?
- É!
- Tá sendo bom com você?
- Não recramo de nada, seu dotô.
- Então se eu não lhe ajudar, o senhor não vai reclamar?
- Gente que não pensa nos outros... tem dinheiro aí e não dá uma ajudinha... é assim mesmo, é assim.... ta certo viu....
- Olha aí, já tá reclamando.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Um debate ético 2

- O que você faria se seu filho dissesse "eu não amo você"?.
- Torturaria!
- Como é??! Você não entendeu o que eu disse!
- Entendi! Torturaria!
- E se esse filho fizesse bem a todos, fosse ótima pessoa, honesto, respeitável, bondoso, caridoso, mas apenas declarasse que não ama você?
- Torturaria pelo resto de sua vida.
- Que horror! Você é igual a Deus!

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Outro?

1ª fase

Uma tribo vivia isolada no meio de uma selva. Eles não conheciam nenhum povo diferente deles. Não passava na cabeça deles que pudesse existir outras línguas, outros costumes, outras religiões. A palavra “outro” sequer existia em sua língua. Eles não davam nome à sua língua, pois não sabiam que poderia existir outra maneira da falar e pensar. Essa tribo não tinha nome. Não precisava, pois eles acreditavam que não existia outra tribo no mundo. Eles tinham certeza de que seu modo de viver era o único no mundo. Eram totalmente ignorantes sobre o mundo além do seu. Mas algo surpreendente aconteceu. Surgiram visitantes de outro lugar do planeta. Era muito estranho para eles ver gente que se vestia diferente, falava diferente.

2ª fase

Mas eles finalmente tinham conhecido algo diferente. No entanto, nada da cultura diferente era considerado plausível. Vou tomar como exemplo aqui e até o final da história a língua (assim como ocorreu com religião, costumes, tabus etc). Quando escutaram aquele povo visitante falar, não consideraram a hipótese de estarem falando outra língua. A única língua existente era a deles. Provavelmente, os visitantes eram tão burros, que não sabiam falar. Tentavam, faziam esforço, buscavam tirar sons garganta afora, mas só o que faziam eram ruídos. A tribo não considerava nem de longe a hipótese de haver outras formas de falar. Eles tinham certeza de que o povo visitante não falava, apenas grunhia.

3ª fase

Após analisarem por meses, começaram a aceitar a possibilidade de a língua dos visitantes ser uma língua de fato. Mas, mesmo assim, não poderia ser uma língua tão boa quanto a deles. Não dava para entender nada, era desconexa e os sons da língua eram feios. Eles perderam a certeza de falar a única língua do mundo, mas tinham certeza de falar a única língua boa, correta e lógica do mundo. Era inadmissível colocar aquela língua bizarra e ininteligível dos visitantes como correta. Com certeza, deveria ser rústica, mal estruturada e com uma gramática praticamente inexistente.

4ª fase

Alguns começaram a querer falar a língua dos visitantes. E surpresa! Descobriram que era um idioma bem estruturado e igualmente eficiente. No entanto, tinha termos inúteis, que falavam de coisas que não existiam. Eles tinham certeza de que palavras como “avião” ou “dinossauro” eram completamente inúteis, pois descreviam coisas imaginárias e sem razão de se imaginar.

5ª fase

Alguns resolveram conhecer o lugar de origem dos visitantes. Descobriram que as palavras desconhecidas não eram inúteis naquela terra. Começaram a ver claramente que cada aspecto da cultura do outro era pleno e útil, mesmo que não fosse na sua cultura de origem. E quanto mais suas mentes se abriam ao conhecimento, ao outro, quanto menos ignorância, mais certezas caíam por terra.

6ª fase

Alguns foram morar no país dos visitantes e fizeram uma descoberta aterradora. A língua dos visitantes não era somente tão eficiente quanto a deles, mas mais que isso: no outro país, era mais eficiente. Eles descobriram que a língua deles só era mais eficiente no seu lugar de origem. Que toda cultura que eles tinham seria considerada estranha em outro lugar. Eles agora é que eram os visitantes. E a única certeza que tinham era a de que, no seu país, as coisas funcionavam melhor.

7ª fase

Conheceram a fundo a língua e toda a cultura do outro. Decidiram não ter mais certezas, pois toda certeza que tinham se mostrava facilmente rebatida. E por melhor embasados que estivessem, sempre haveria algo no mundo que poderia questionar suas certezas. Menos ignorantes do que antes, conhecedores da palavra “opinião”, decidiram algo: manteremos algumas de nossas convicções e mudaremos outras. No entanto, não teremos mais certeza de nada, pois o meu ponto de vista nunca será perfeito e sempre estará sujeito a questionamento e a ser derrubado.

E então meu Brasil? Quando nós aqui sairemos da 2ª fase? (Se for ser generoso, talvez até dê para achar que uma parte do povo está beirando a 3ª fase... não muitos, não mais que isso). A língua foi só um exemplo. Neste texto se encaixam língua, variedade linguística, religião, orientação sexual, filiação política etc.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

Um debate ético

- Me diz uma coisa... você tem uma filha... fica sabendo que alguém pretende estuprá-la e você tem como impedir... você vai impedir?
- É óbvio! Mas que pergunta!
- Ok... mas e se você tem um filho e descobre que ele quer estuprar alguém, e você pode impedi-lo, você o impede?
- Mas isso é lógico! Eu impediria em ambos os casos.
- Deus não.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Só umas piadinhas

Inspirado no genial http://divasca.blogspot.com, eis um diálogo aqui que mostra claramente a raiva que nós comediantes temos da tendência frequente que as pessoas têm de desvalorizar o nosso trabalho. Essa ideia não é original, o Di Vasca faz isso magistralmente. Mas tive vontade também.


De: Carlos Mendes
Para: Alyson Vilela
Enviada: Sexta-feira, 05 de agosto de 2011 9:39
Assunto: Formatura de medicina


Oi Alyson, tudo bom? Acho que o grupo de vocês é muito bom. Fui a um show de vocês no teatro e me borrei de rir! Então, estou me formando em medicina e quero convidar vocês para fazer uma apresentação na minha festa de formatura. O pessoal já concordou, vocês se apresentariam antes da banda. Abraço.


De: Alyson Vilela
Para: Carlos Mendes
Enviada: Sexta-feira, 05 de agosto de 2011 11:06
Assunto: RE: Formatura de medicina


Oi Carlos, tudo bem? Será um prazer trabalhar com vocês. Gostaria apenas de algumas informações para mandar o orçamento pra vocês: 1) para quantas pessoas é o evento?; 2) quanto tempo vai durar nossa apresentação? Sugiro que não seja tão longa (uns 40min), pois em uma festa, as pessoas esperam pela banda e podem ficar impacientes.; 3) em que tipo de ambiente vai ser? Abraço.


De: Carlos Mendes
Para: Alyson Vilela
Enviada: Sexta-feira, 05 de agosto de 2011 17:58
Assunto: RE: RE: Formatura de medicina


Alyson, o evento será na ** Casa de Festas, para 300 pessoas. Quanto à duração, pode ser sim de 40 minutos.


De: Alyson Vilela
Para: Carlos Mendes
Enviada: Sábado, 06 de agosto de 2011 12:13
Assunto: RE: RE: RE: Formatura de medicina


Carlos, seguem anexos o orçamento e as condições de show. Abraço.


De: Carlos Mendes
Para: Alyson Vilela
Enviada: Sábado, 06 de agosto de 2011 14:29
Assunto: RE: RE: RE: RE: Formatura de medicina


Rapaz! Abri seu orçamento e quase caio pra trás! Será possível que é tão difícil fazer umas piadinhas no palco?


De: Alyson Vilela
Para: Carlos Mendes
Enviada: Sábado, 06 de agosto de 2011 15:00
Assunto: RE: RE: RE: RE: RE: Formatura de medicina


Olá Carlos. Está tudo bem com você? Já aconteceu comigo de estar diante do computador e quase cair pra trás. É bom fazer exames; eu fiz e descobri que estava com anemia. Lembre-se que uma anemia mal resolvida pode se tornar leucemia. No meu caso, eu estava com um tumor maligno no rim direito. Quase morro! Os médicos disseram que isso causou a anemia. E olhe que eu já tinha metástase! Fique atento. Mas voltando ao assunto, realmente não pode ser tão difícil assim subir em um palco e contar umas piadinhas. Eu tenho um tio que em toda festa fica bêbado e conta piadinhas na frente de todo mundo. Ele é hilário, metade da festa ri e a outra metade fica constrangida. Mas como sua festa é de gente jovem, acho que ninguém ficaria constrangido. Posso mandar ele no meu lugar? Vai ser uma mamata.


De: Carlos Mendes
Para: Alyson Vilela
Enviada: Segunda-feira, 08 de agosto de 2011 10:10
Assunto: RE: RE: RE: RE: RE: RE: Formatura de medicina


Cara, você ganha mais por show do que um médico em uma consulta! Absurdo!


De: Alyson Vilela
Para: Carlos Mendes
Enviada: Segunda-feira, 08 de agosto de 2011 10:15
Assunto: RE: RE: RE: RE: RE: RE: RE: Formatura de medicina


Por isso que a Unimed tentou fazer convênio com a gente e eu neguei. E tem mais, não são só os planos de saúde que se amarram para pagar profissionais. Isso começa desde cedo: até formandos em medicina já são mão de vaca. Acho que eles aprendem isso no curso.


De: Carlos Mendes
Para: Alyson Vilela
Enviada: Segunda-feira, 08 de agosto de 2011 11:08
Assunto: RE: RE: RE: RE: RE: RE: RE: RE: Formatura de medicina


Véio esquece. Vamos ficar só com a banda mesmo.

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

O espírito cristão

Eu não gostaria de ser entendido como um militante de alguma corrente de pensamento. Talvez isso seja inevitável. Não sei... eu não quero defender valores como absolutos. Apenas quero falar de questões na nossa sociedade que creio que causam visíveis males a quem vive nela. Não acredito que existam atitudes nem pensamentos moralmente falhos, a menos que esses prejudiquem as pessoas. Assim sendo, quero falar sobre conceitos que, creio eu, prejudicam as pessoas.

Eu poderia falar de pensamentos religiosos de várias partes do mundo, mencionar as religiões mais diversas... a simples escolha do cristianismo é pela razão mais óbvia: eu sou brasileiro, vivo em um meio cristão, fui cristão por 24 anos da minha vida e conheço bem a Bíblia. Conheço bem o comportamento dentro das igrejas sobretudo evangélicas, da qual fiz parte (fui presbiteriano). Sem mais explicações, vou direto ao ponto. Há vários conceitos fortes no nosso meio que têm causado problemas. Eis alguns:

Lutas antinaturais

“Então disse Jesus aos seus discípulos: Se alguém quiser vir após mim, renuncie-se a si mesmo, tome sobre si a sua cruz, e siga-me” Mateus 16:24

A primeira luta antinatural é a mais forte no cristianismo moderno: a castidade. Isso, para alguns, vai parecer um conceito ultrapassado, mas não é. Temos várias manifestações diferentes desse problema, sendo, aparentemente, todas elas danosas.

Antes de entrar nessa questão, é bom lembrar que o cristianismo vê, desde o Gênesis, o ser humano não como uma parte integrante da natureza, mas como um ser acima dela. “Façamos o homem à nossa imagem e conforme a nossa semelhança e domine sobre toda espécie vivente”. Gênesis 1.

Somos, segundo essa fé, semelhantes a Deus e donos (dominação e dono têm a mesma etimologia) da natureza. Somos os senhores sobre os animais. Não é preciso detalhar muito os resultados catastróficos desse tipo de pensamento: desflorestamento, caça desenfreada, competições esportivas baseada na dor dos animais (vaquejada, tourada, rodeio, caça esportiva etc), casacos feitos de pele retirada de maneira extremamente dolorosa etc. Religiões que vêem o homem como uma parte igual da natureza costumam incitar a uma vida em harmonia com a mesma.

Quando nos colocamos como “acima da natureza”, nos impomos também um dever moral: não seguir nossos instintos naturais, que são sujos, inferiores, “as obras da carne” (Gálatas 5), animalescos, que nos tiram da posição de senhores e nos devolvem à posição de igualdade. Devemos estar acima dos nossos instintos.

Assim, lutamos contra instintos sexuais, alimentares, linguísticos (que, segundo o Gerativismo, são também naturais) e tantos outros. Pessoas julgam outras por causa de bebida, palavras consideradas chulas ou até orientação sexual. Porque o homem é superior. Mais de 400 espécies de animais praticam o homossexualismo e isso é coisa de animal. Quando o ser humano pratica, é coisa suja, justamente porque somos mais que animais.

Não é preciso conhecer muito do mundo para saber que toda repressão leva a problemas. Sociedades sem muitos tabus sexuais não costumam ter a mesma proporção de estupros, pedofilia e tantos transtornos sexuais que a nossa. Toda repressão faz o instinto escapar por outro lugar. E não podemos arriscar... isso pode ser muito perigoso. O cristianismo prega a libertação de uma cadeia e aprisionamento em outra. Da cadeia do sexo irresponsável à cadeia da castidade. Da cadeia do alcoolismo à cadeia da abstinência (não estou dizendo que alguém que deixou o alcoolismo deve beber. Mas pessoas que não têm esse problema serem proibidas é absurdo).

E essas repressões afetam a toda a sociedade, inclusive quem não crê. Afeta a todos, pois estão mergulhados nessa cultura. Quantos ateus há que levam a vida sexual com culpa, dificuldade, porque foram educados a achar que é assim? Entendo que castidade ou abstinência alcoólica são escolhas pessoais. É problemático que alguém ache que suas conclusões servem para todos e sair pregando essa opção de vida como a única correta. Isso leva ao próximo ponto.

Pregação de valores absolutos

Certa vez, um amigo organizou um encontro para falar sobre o zen-budismo. Um amigo cristão falou que pediria a Deus para abrir os olhos dessas pessoas cegas e preencher aquelas vidas vazias. Não vou falar sobre a questão de salvação; vamos falar de assuntos palpáveis.

O cristão mediano tende a achar que alguém não pode ser feliz se não acreditar nas coisas que ele acredita. As pessoas, segundo o cristianismo proselitista, possuem um vazio em sua alma que deve ser preenchido por Jesus Cristo. Assim, ninguém pode ser feliz se não tiver chegado à mesma conclusão que levou à mesma fé que o cristão.

E a questão vai muito além da felicidade. Ela toca a moral. Assim, pessoas que não têm os mesmos valores não são somente infelizes, mas são pecadores não redimidos e pensam errado, por causa de sua suposta cegueira espiritual.

Hoje mesmo, vi um cristão – cujo mandamento principal é o amor – dizer que uma mulher que aborta é um monstro. Bem-vindos ao mundo moralista onde o sentimento do outro não vale mais do que lixo. Não estou dizendo que essa mulher que aborta está certa ou errada. Mas chamá-la de monstro sem ao menos conhecer sua história, é um bom exemplo de como não se ouve o “não julgueis” de Cristo.

Imagine uma mulher que foi estuprada, que cada vez que olha para sua barriga, chora lembrando que dará a luz o fruto da violência. Chora todos os dias por sentir seu corpo invadido e nojo por ser fecundada com a semente do homem que a invadiu e a desrespeitou como ninguém nesse mundo. Minha discussão aqui passa longe de “é certo ou não essa mulher abortar?”. Mas é de um moralismo de profunda insensibilidade olhar para o argueiro no olho dessa mulher e dizer “que monstro, abortou, matou um ser humano”. Tira a trave do teu olho!

Tudo é culpa e ameaças, como aqueles e-mails desaforados dizendo “Com Deus não se brinca” e mostrando gente que morreu por ter feito isso.

Julgamento exacerbado

“Não julgueis, para que não sejais julgados” Mateus 7.1. É, Jesus, seus seguidores não aprenderam muita coisa. Toda pessoa que age de acordo com crenças diferentes do cristianismo é pecadora e errada. Não importa o caminho que a pessoa traçou até chegar onde está. O moralismo ignora as necessidades humanas. O moralismo é insensível. Segundo o ele, o homem deve servir à moral e não a moral ao homem.

Uma pessoa, motivada por questões psicológicas profundas, necessidades básicas humanas é reduzida a uma simples pecadora. Imagino o caso de uma mulher que apanha do marido e deixa de comungar na igreja católica por ter cometido o pecado do divórcio. Outra, que passou a vida sendo ignorada pelo pai, e que sai com vários homens para sentir aquilo que mais lhe falta: o amor de um homem (não entremos na questão da eficacidade dessa opção. Atentemos apenas para a dor alheia). Essa mulher é solapada de sua posição de dor e autoestima baixa e levada à simples posição de pecadora. Nas palavras mais adequadas, puta.

Tudo gira em torno da culpa. Não crer é pecado. Sexo fora do casamento é pecado. Beber é pecado. Divórcio é pecado. Comer muito é pecado. Masturbação é pecado. Palavrão é pecado. Pecado, pecado, pecado! Respirar é pecado, se não for para a glória de Deus. E se um olho te faz pecar, arranca-o fora. Mateus 5.29. É a religião da mortificação do corpo em prol de uma suposta glorificação alma.

Ódio religioso

Este tópico será curto, pois não é preciso argumentar muito para mostrar que o cristianismo é disseminador de ódio religioso. Pastores evangélicos dizendo que a umbanda é coisa do demônio, cristãos (e não poucos) dizendo que ateus não têm bom caráter, e-mails em massa falando que o Islã está horrorizando o mundo. Saiu em um jornal dos EUA uma matéria falando sobre ateus perseguidos e até linchados em pequenas cidades do país, outros perseguidos no trabalho e até demitidos.

Sobre o Islã, é bom lembrar duas coisas: 1) o Islã convivia pacificamente na Europa, até que os católicos resolveram expulsá-los. Fizeram cruzadas em que matavam muçulmanos como quem mata baratas. Santa Inquisição, nem se fala. Depois de tudo isso, um muçulmano que não gosta de cristão é considerado mau? 2) o terrorismo causador de medo dos muçulmanos tem muito mais a ver com marketing do que com o Islã.

O cristão critica o jihad (guerra santa islâmica), mas não se dá conta do seu próprio jihad. Ele critica, persegue, censura, olha torto para pessoas que não creem e/ou não seguem o padrão de sua fé.

Eterno retorno ao sacerdote

Parafraseando Nietzsche, tudo gira em torno do poder do sacerdote. O cristão é sobrecarregado de culpas, dores, pecados, medos da condenação e está sob o poder do sacerdote. Nada melhor para dominar alguém do que dominar todos os seus prazeres e crenças sob a ameaça da condenação eterna.

O sacerdote é tão importante e tem um domínio tão forte, que se coloca entre o homem e sua divindade. O homem não é sequer capaz de confessar seus próprios pecados; deve passar pela mediação do sacerdote.

Justiça seja feita, os evangélicos não têm essa prática. Mas se engana quem acredita que o evangélico se vê em livre acesso ao seu deus, pelo fato de não precisar se confessar com o seu pastor. O pastor é o guia espiritual, que conduz seu rebanho no caminho bom (segundo ele) e que pune aqueles que transgridem a lei. Um pastor pode tomar medidas disciplinares, chegando até ao ponto de afastar uma pessoa da comunhão, momento máximo do culto evangélico, em que os fiéis se vêem na mais profunda conexão com a divindade. Se você pecar, até disso será privado.

O clericalismo não é uma maldição unicamente da Igreja Católica, apesar de ser filho de suas entranhas. O evangélico enxerga seu pastor como alguém mais próximo de sua divindade, que tem poder sobre decisões que deveriam ser totalmente individuais e subjetivas. O pastor, assim como o padre, é o representante de Deus na terra. O que Lutero falou sobre o direito do fiel à interpretação bíblica, esqueça tudo isso. A Bíblia já chega aos seus fiéis interpretada e qualquer discordância resulta em engano; qualquer engano resulta em pecado; qualquer pecado resulta em condenação eterna da alma. O clero já interpretou a Bíblia da “melhor maneira possível”. Já mastigou todo o seu conteúdo. O dever dos fiéis é engolir.

Me antecipando a certos comentários

“Você não deve generalizar”

É bom lembrar que é completamente impossível falar de um grupo sem generalizações. Quando se diz “Os alemães são brancos”, isso é uma generalização e não é mentira. Errado seria fazer uma “totalização”, dizendo “Todos os alemães são brancos”, pois há alemães negros e de outras etnias. Assim sendo, uma generalização não afirma “Todos são...” mas “Pessoas desse grupo, geralmente são...”. Sem as generalizações, não se pode falar de características de nenhum grupo. Há cristãos que não agem da maneira como falei.

“Este não é o verdadeiro cristianismo”

Não sei o que você entende por cristianismo, mas vamos lá: cristianismo é uma religião fundada pelos apóstolos (Pedro e Paulo, sobretudo), baseada no Velho Testamento e nos ensinos e morte de Jesus (e na crença de que ele é Deus e de que ressuscitou). Essa religião se desenvolveu até se tornar a religião oficial de Roma. Depois de alguns séculos, se tornou a Igreja Católica, que, depois de mais uns séculos, sofreu uma divisão chamada de Reforma Protestante. Há outros segmentos do cristianismo, mas esses são predominantes. Qualquer pessoa que se diga católica ou protestante ou simplesmente diga que crê na Bíblia, em Jesus Cristo e em um Deus triuno é cristã.

É muito fácil dizer que pessoas que agem mal não são cristãs. Assim, o cristão, mais uma vez, em seu sentimento profundo de superioridade, afirma que cristãos nunca têm mau caráter. Pergunto-me até quando os evangélicos vão se surpreender ao ver uma matéria “Fulano (evangélico) matou o pai”. Está na hora de parar de se surpreender. Pessoas de todos os segmentos matam! Inclusive cristãos!

Quando você se sentir tentado a dizer “violência não é coisa de cristão”, lembre-se da inquisição, autos-da-fé, cruzadas, salmos de guerra, linchamentos entre católicos e evangélicos (muito comuns no séc. XX e atuais em algumas cidades do interior), a briga entre a Irlanda do Norte e a Irlanda do Sul, o fato de a maioria dos presidiários no Brasil serem cristãos e não diga.

Para finalizar

Não creio que há crenças de todo ruins ou de todo boas. Mas falo do que me incomoda. Posso estar enganado, como qualquer pessoa pode. O problema do cristianismo de um modo geral é que ele não se permite engano. “Ou você crê como nós, ou está errado”. Eu não falo aqui para que cristãos deixem de ser cristãos. Quem se sente feliz assim, que o seja.

Eu me oponho, na verdade, à postura absolutizante e geradora de culpa do cristianismo. Não importam suas experiências de vida, seus sentimentos, o que mais importa para você: a regra é essa e é inflexível. Se você não a seguir, está errado e sujeito à condenação. Me oponho a essa manipulação de massas que se sentem oprimidas pela dor da culpa e se vêem dependentes dos seus guias espirituais. E me oponho, por fim, à pregação de abstinências, que deveriam ser escolhas pessoais, mas se tornam a única coisa certa a ser seguida, e cujo contrário é abominação a Deus e passível de condenação.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

E o aluno sempre tem a culpa

Este é um assunto que não costumo tratar aqui no meu blog. Porém hoje ouvi coisas a esse respeito que reacenderam minhas preocupações já antigas. Antes de tudo, para aqueles que não sabem, eu sou professor. E, nesse momento, não é a minha classe que vou defender; nem atacar. Apenas colocar no devido lugar.

Com teorias que refutaram o behaviorismo, a ideia de tábua rasa, de mentes vazias que deveriam ser preenchidas e do condicionamento através do comportamento, o aluno vem, há décadas, ganhando um papel mais ativo no processo de ensino-aprendizagem. O personagem central da educação deixou de ser o professor e passou a ser o aluno. Deixou-se de privilegiar o conteúdo e passou-se a privilegiar o processo. Assim, tentou-se garantir um espaço em que o aluno é dono de sua educação e não um objeto.

Entretanto, ainda hoje reina, nas mentes mais retrógradas, a ideia de que o professor sempre está correto. De que o aluno é sempre o culpado pelo fracasso escolar. Quem nunca ouviu o seguinte diálogo, depois que um filho tira nota baixa: “Mas mãe, todo mundo se deu mal nessa prova”. E a mãe responde “mas você não é todo mundo”?

Esta resposta da mãe revela duas problemáticas que eu considero graves:

1 – A mãe transmite ao filho uma arrogância que fere questões éticas muito mais importantes do que saber diferenciar um verbo intransitivo de um verbo transitivo direto. Como assim “você não é todo mundo”? Sinto quebrar as ilusões da arrogante mamãe que ensina seu filho a também ser arrogante, mas seu filho é sim parte do “todo mundo”. E ele quer ser todo mundo! Ele quer ser especial de certa forma, mas não especial a ponto de ter menos direitos ou mais deveres do que os outros. Isso não é educação. É opressão. Qual o problema em ver seu filho na média dos demais?

2 – Quando os pais pressionam seus filhos por uma nota baixa, sabendo que todos da turma se deram mal, eles automaticamente consideram que a culpa nunca é do professor. Sempre é do aluno. Este é um conceito que há décadas está ultrapassado, mas por décadas ainda apodrece na mente de alguns pais. O fracasso escolar não pode obrigatoriamente ser imposto ao aluno. Há diversos fatores que podem resultar no fracasso e apenas um deles é a falta de esforço do aprendiz. Se toda a turma se deu mal, é bom começar a se questionar se o professor está mesmo trabalhando de maneira adequada. O fracasso de toda uma turma é bem mais provável ser culpa do professor do que de todos os alunos.

E essas são questões para nós professores também atentarmos. Não somos os donos do saber. Não entramos em sala de aula para transmitir conhecimentos aos aprendizes. Entramos lá para estimular processos cognitivos que farão com o que o aluno, por suas próprias deduções, cheguem ao resultado. Somos apenas facilitadores, que, muitas vezes, em vez de facilitar, dificultamos tudo e tornamos a vida dos nossos alunos um inferno. Pais e professores, pensemos juntos nisso.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

É verdade que o português é uma das línguas mais difíceis no mundo?

Vou mudar o tema do blog por um instante. Vou falar de uma paixão minha que muitos não conhecem: ciências da linguagem (tenho mestrado em linguística). Vieram me fazer essa pergunta dia desses. É uma afirmação bem frequente a de que o português é uma das línguas mais difíceis do mundo. Isso é verdade? Eis a resposta.

Não. Primeiro, vou levantar questões que são levadas em conta para se afirmar que uma língua é difícil, e mostrar que o português não chega nem perto. Depois, mostrar que nem mesmo essas questões dão conta de achar qual língua é difícil e qual é fácil.

Em primeiro lugar, quando se fala em língua complexa, a questão que se faz é: em que aspecto? As línguas têm diversos aspectos, tais como fonologia, morfologia, sintaxe, léxico etc. Vamos levantar alguns desses aspectos e alguns argumentos usados para dizer que o português é uma das línguas mais complexas do mundo:

Morfologia - o português tem conjugações verbais, formas plurais e singulares, formas masculinas e femininas dos nomes, bem como aumentativos e diminutivos.
Por esses argumentos, a língua portuguesa fica longe de ser das mais complexas. Enquanto um substantivo tem duas formas no português (singular e plural), ele tem nove formas em russo, com as declinações. Na língua inuit, dos esquimós do Alaska, Canadá e Groenlândia, existem mais de 800 formas infinitivas para cada verbo, contra duas no português e mais de mil formas conjugadas, contra dezenas no português.

Fonologia - a língua inglesa possui muito mais fonemas tanto vocálicos quanto consonantais que o português. Existem línguas tonais, que são aquelas em que o tom de voz muda completamente o sentido de uma sílaba. No chinês, você, com a mesma sílaba, pode dizer mãe, cavalo ou outras três coisas diferentes, apenas mudando o tom.

Léxico - um dos argumentos usados é que o português tem palavras que podem significar muitas coisas diferentes. Essa é a maior falácia de todas. Não que não seja verdade... mas não é exclusividade do português. Toda, absolutamente toda língua natural, sem nenhuma exceção, tem essa característica. Uma palavra que pode significar várias coisas, uma coisa que pode ser dita através várias palavras. É a noção de significado e significante de Saussure, que, unidos, formam um signo linguístico (esse conceito fica para outra explicação).

Sintaxe - as estruturas frasais entre as línguas são diferentes. Não digo mais que isso. Não são mais fáceis, não são mais difíceis. São diferentes. No português, temos preposições, no japonês, posposições. Em português, a estrutura das frases é Sujeito, Verbo, Objeto, em japonês, Sujeito, Objeto, Verbo. Isso complica para quem fala uma língua diferente, mas não significa que seja mais complexo.

Estudos no campo da aquisição da linguagem mostram que as crianças aprendem estruturas básicas, desenvolvem e chegam à fluência em sua língua materna mais ou menos na mesma idade. E para TODAS as línguas. Não existe uma língua que as crianças nativas demorem mais a aprender do que outra. Isso mostra que não existem línguas mais complexas que outras... elas são apenas diferentes, com complexidades diferentes em pontos diversos.

A ideia de que o português é difícil é pura vaidade. É uma maneira de dizermos "somos inteligentes, falamos essa língua difícil". Esse discurso pode ser ouvido na França, sobre o francês, nos EUA sobre o inglês. É uma vaidade boba que temos.

Outro problema é que a escola ignora completamente a nossa língua real e quer nos empurrar goela abaixo uma língua ideal e irrealizável. Assim, as pessoas criam o mito de que "nem os brasileiros sabem falar a sua língua" (ideia completamente falaciosa e ignorante dos princípios linguísticos mais básicos), ou seja, "a língua é muito difícil". Nós sabemos falar muito bem a nossa língua. O problema é que a nossa língua não é aquela que a escola tenta nos impor. E esse fenômeno, diga-se de passagem, acontece em outros países também. O francês também acha que os próprios franceses não falam bem a própria língua. Isso não passa de um mito baseado na superioridade linguística de certas classes (tema esse que ficará para outro texto).

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Seis não é meu assunto. Meia dúzia, sim.

Ontem algumas colegas, abismadas com a inaceitável frase “eu não acredito que haja um deus”, vieram tentar me convencer com os mais variados argumentos de que estou errado. Tentavam até mesmo me intimidar com os perigos da pesada mão de Deus sobre os ingratos. Outra colega me disse que aceitava que dissessem “não tenho religião”, mas “não creio em Deus” era difícil. Outras tentaram provar que creio em Deus, pelo fato de usar a expressão “meu Deus”. Outra disse que eu deveria pedir perdão a Deus. Não preciso nem falar na incapacidade das pessoas de aceitar a diferença. Mas isso já está batido... quero abordar outra coisa.

Essas colegas começaram a me pressionar para mostrar quão errado estou. Eu falei “gente, não estou querendo falar de religião agora”. E eis a resposta que tive: “eu não falo de religião. Só falo de Deus”. Essa expressão não é nada original na verdade. Os evangélicos são ensinados a usá-la para rebater o “não se fala em religião”. E os desavisados engolem esse sapo. Para mim, essa frase é tão absurda quanto “eu não falo de mecânica, falo de motores dois tempos com cárter molhado, virabrequins e suspensões”.

A frase “não falo em religião, falo em Deus” vai além de uma manipulação barata que os incultos engolem. Não é somente uma frase comicamente absurda, tão engraçada quanto a da mecânica. É uma mostra clara da intolerância e da incapacidade de perceber até onde seu discurso expressa uma ideia e não um fato. Ora, para começo de história, não é preciso acreditar em um deus para se ter religião. Os taoístas, alguns budistas e algumas culturas animistas possuem todo um conjunto de crenças, mas não acreditam na divindade. Isso significa que falar em um deus ou em deuses inclui certas religiões (cristianismo, hinduísmo, islamismo) e exclui outras.

Além disso, cada religião teísta enxerga seu deus de uma maneira diferente. No islã, Deus é uno e não se aproxima dos homens. No cristianismo, ele é triuno e uma de suas pessoas veio viver entre os homens. No catolicismo, especificamente, Deus conta com a ajuda de diversos santos intercessores (o cristianismo tem uma [bela?] nuance de politeísmo). No hinduísmo, o politeísmo é declarado, assim, não há um deus totalitário. Assim sendo, quando uma pessoa fala de Deus ou dos deuses, podemos, pela maneira de falar, saber ou, pelo menos, deduzir qual a sua religião.

Então essa frase mostra a arrogância implícita do pensamento “se eu creio assim é porque é assim. Quem crê diferentemente de mim está errado”. Todo conhecimento que temos, sistema de crenças, sentimentos etc. são baseados no contato que temos com o mundo. Este contato não é direto, mas mediado por sentidos e interpretado por uma série complexa de operações cognitivas. É impossível ter certeza de que aquilo que eu vejo corresponde bem ou mal à verdade. Não dá pra dizer se alguém vê o azul de maneira tão correta quanto eu. Isso porque não há maneira correta de enxergar algo, mas sim, um ângulo que me propicia uma visão X e não Y daquela coisa.



Um cristão que tem certeza de que Cristo é o salvador não tem mais certeza do que a que um muçulmano tem de que Cristo é só um profeta. E como dizer quem está certo, se ambos têm a mesma certeza? Alguém vai me dizer “isso é uma questão de fé”, que é o coringa para resolver essa situação. É a opção para não pensar, pois esta frase anula qualquer possibilidade de reflexão e questionamento. Crer que Jesus é deus é tanto questão de fé quanto crer que ele é só um profeta. Voltamos à mesma: não há como saber quem tem a razão ou se, na verdade, existe alguma razão nisso.

Parafraseando o amigo escritor Félix Maranganha, o mundo não é por si lógico. A lógica é a maneira como os humanos organizam suas ideias. Assim sendo, impomos lógica ao mundo. Ou seja, a realidade não está no mundo, mas nas nossas mentes. O mundo não é nem deixa de ser como pensamos... o mundo apenas é... uns dizem que ele é azul, outros dizem que é preto, outros, que é rosa e tem alguns que acham que todos os outros são daltônicos. Quem está certo? Não sei. Precisamos mesmo que alguém esteja certo? “Eu acredito” e “eu não acredito” são frases que trazem por elas mesmas uma dúvida. Por que não parar de tentar achar desculpas para aquilo que não se sabe e, em vez disso, pronunciar um sonoro e libertador “eu não sei”?

quarta-feira, 1 de junho de 2011

E o seu filho?

Um amigo evangélico conversando com a minha mãe (também evangélica):

- Mas me conta, irmã, como tá seu filho? Soube que vendeu a moto.
- Vendeu né... depois daquele acidente que deixou o braço direito dele com dificuldade de movimento...
- Ahm.... é... mas continua firme na fé do Senhor?
- Virou ateu - fala minha mãe com tristeza.

Um silêncio perdura alguns segundos no ambiente, até que ele tenta confortá-la.

- Mas o importante é ter saúde, né irmã?
- Tá com câncer.

Cri, cri, cri, cri......

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Politicamente correto (Nordestino não, proveniente de região setentrional-oriental brasileira)

“Não faça piadas com câncer, isso ofende quem tem câncer”. “Não brinque com deficientes, eles já sofrem demais”. “Evite fazer com que um negro se sinta inferior”. Essas são as palavras do século XXI. Tem também os ecologistas que dizem que nosso mundo vai acabar, mas isso fica para outro texto. Bem, estou falando aqui do politicamente correto.

O que me motivou a escrever sobre isso

Estive por algum tempo observando a conduta dos ditos politicamente corretos e fiquei de longe. Nunca gostei daquela postura quase religiosa “eu sou melhor do que você”, mas nunca pensei em escrever sobre o assunto. Preferi observar de longe.

Porém isso mudou ontem, dia 03 de abril de 2011. Resolvi fazer um chat na Justin.tv cujo título era “Câncer, remédios e outras amenidades”. Foi um chat bem humorado, tratando o câncer com piada, já que sou humorista. Me dei esse direito, pelo fato de eu mesmo estar atualmente enfrentando um câncer, que me fez perder o rim direito e ser operado do fígado, por causa de três metástases. Além disso, o câncer chegou a invadir o coração.

Uma mulher entrou achando que eu era médico e estaria dando informações valiosas sobre o câncer. Quando descobriu que eu sou humorista e que estava tratando tudo com piada, disse que eu era idiota por brincar com isso, por ser desrespeito a quem está doente. Politicamente corretos, vocês sabiam que ver um paciente de câncer fazer piada com isso motiva outros pacientes? Sabiam que pode ser uma informação tão valiosa quanto “passe protetor solar para evitar câncer de pele”? Continuando...

Com o que se pode brincar?

Eis a questão. Ano passado, sofri um acidente de moto que me deixou com limitações consideráveis de movimentos no ombro direito. Ontem mesmo minha cunhada brincou com o meu irmão, dizendo que estacionasse na vaga de deficiente por eu estar no carro. Era apenas uma brincadeira, já que não tenho dificuldade de locomoção. Sorri. Isso não me incomodou nem um pouco. Sou um prato cheio para os politicamente corretos que querem defender os “fracos e oprimidos”. Nordestino, deficiente de um braço e paciente de câncer. Eles devem morrer de peninha de mim. Eu sou um coitado. Daqui a pouco falo sobre isso... estou adiantando as coisas.

Voltando. Parte da cura de um câncer está no seu psicológico, em manter o bom humor e nunca se abater. Quer melhor efeito placebo do que acreditar tanto que aquilo é bobagem, a ponto de fazer piadinhas e achar que tudo é uma brincadeira?

As sensibilidades são diversas... uns acreditam que se deve brincar, outros não. O que eles não entendem, é que deveriam parar de teorizar, ficar levantando conjecturas sobre o que ofende e o que não ofende e perguntar a nós! Teorias não dão conta de dizer o que nós sentimos.

Os politicamente corretos sabem como nos defender...?

Pois é. Existe um grupo superior de seres humanos que sabem muito melhor do que todos (inclusive do que nós fracos e oprimidos) como se deve tratar alguém. Está com câncer, fale com ele em tom sério e motivador. Tem deficiência física, nunca olhe para o local afetado... isso ofende. É negro, nunca mencione a cor da pele dele. Se mencionar, elogie, dizendo que é uma cor bonita. Está em um velório, não sorria.

Talvez eu esteja exagerando um pouco, não sei. O que eu sei é que as pessoas parecem querer nos defender de algo. Elas se enchem de um sentimento de “peninha”, ou “oh, tadinho dele, tão jovem” (tenho 27 anos), e acham que devem montar guarda ao nosso redor. “Ei, você. Gosta de fazer piadinha sobre câncer? Esse cara aqui ta com câncer. Vai, vai, circulando, circulando.” “Você. É homofóbico? Esse cara aqui é gay, eu tenho que defendê-lo. Fica longe, vai pra lá”.

De repente, o deficiente físico, o paciente de câncer, o negro, o homossexual etc. se tornam objetos. Não temos voz, não temos direito de gostar de um humor dito de “mau gosto”, não temos condições de nos defender. Mais uma vez, somos uns pobres coitados que merecem pena e devem ser protegidos pelos politicamente corretos, que são fortes, ousados e poderosos. Os defensores da humanidade.

E a minha voz? Senhores defensores da humanidade, escutem...

Eu estou lutando contra o câncer! Estou abatido e deprimido? Nem de longe. Preciso de gente me defendendo e ensinando às pessoas sobre como se deve e como não se deve falar do meu câncer? Não! Eu perdi um rim e não minha consciência! Eu não preciso de vocês me defendendo!

É feio tirar brincadeira com meu braço porque ele não se movimenta tão bem quanto deveria? Deixem que EU diga se é feio ou não! Parem de falar daquilo que vocês não conhecem. Vocês não sabem se uma pessoa com câncer fica triste quando alguém diz “tentou de tudo para emagrecer e não conseguiu? Tente um maravilhoso câncer!”. Vocês não sabem porque não foram vocês que caíram de 76kg para 63! Eu sei o que é isso! Eu posso falar.

E eu falo...

Meus queridos colegas humoristas, eu os autorizo a fazer piada com isso. Podem dizer que câncer é bom para os gordinhos. Eu não vou ficar tristinho. Meu ombro não se mexe bem, dói e tenho dificuldade de pegar qualquer objeto 10cm acima da minha cabeça. Queridos colegas, vocês tem meu aval para brincar com isso. Sou nordestino e podem fazer piadinhas de nordestino! Fiquem à vontade... mas é melhor se apressarem. Provavelmente eu vou fazer piada disso tudo antes de vocês.

E se eu tivesse pinto pequeno, também não me importaria que fizessem piada. Mas isso não, que aí já seria muita filha da putice da natureza com a mesma pessoa. E quanto aos politicamente corretos defensores da humanidade, agradeço muito a boa vontade e as boas intenções (das quais o inferno está cheio), mas eu não preciso de vocês...