terça-feira, 6 de setembro de 2011

E o aluno sempre tem a culpa

Este é um assunto que não costumo tratar aqui no meu blog. Porém hoje ouvi coisas a esse respeito que reacenderam minhas preocupações já antigas. Antes de tudo, para aqueles que não sabem, eu sou professor. E, nesse momento, não é a minha classe que vou defender; nem atacar. Apenas colocar no devido lugar.

Com teorias que refutaram o behaviorismo, a ideia de tábua rasa, de mentes vazias que deveriam ser preenchidas e do condicionamento através do comportamento, o aluno vem, há décadas, ganhando um papel mais ativo no processo de ensino-aprendizagem. O personagem central da educação deixou de ser o professor e passou a ser o aluno. Deixou-se de privilegiar o conteúdo e passou-se a privilegiar o processo. Assim, tentou-se garantir um espaço em que o aluno é dono de sua educação e não um objeto.

Entretanto, ainda hoje reina, nas mentes mais retrógradas, a ideia de que o professor sempre está correto. De que o aluno é sempre o culpado pelo fracasso escolar. Quem nunca ouviu o seguinte diálogo, depois que um filho tira nota baixa: “Mas mãe, todo mundo se deu mal nessa prova”. E a mãe responde “mas você não é todo mundo”?

Esta resposta da mãe revela duas problemáticas que eu considero graves:

1 – A mãe transmite ao filho uma arrogância que fere questões éticas muito mais importantes do que saber diferenciar um verbo intransitivo de um verbo transitivo direto. Como assim “você não é todo mundo”? Sinto quebrar as ilusões da arrogante mamãe que ensina seu filho a também ser arrogante, mas seu filho é sim parte do “todo mundo”. E ele quer ser todo mundo! Ele quer ser especial de certa forma, mas não especial a ponto de ter menos direitos ou mais deveres do que os outros. Isso não é educação. É opressão. Qual o problema em ver seu filho na média dos demais?

2 – Quando os pais pressionam seus filhos por uma nota baixa, sabendo que todos da turma se deram mal, eles automaticamente consideram que a culpa nunca é do professor. Sempre é do aluno. Este é um conceito que há décadas está ultrapassado, mas por décadas ainda apodrece na mente de alguns pais. O fracasso escolar não pode obrigatoriamente ser imposto ao aluno. Há diversos fatores que podem resultar no fracasso e apenas um deles é a falta de esforço do aprendiz. Se toda a turma se deu mal, é bom começar a se questionar se o professor está mesmo trabalhando de maneira adequada. O fracasso de toda uma turma é bem mais provável ser culpa do professor do que de todos os alunos.

E essas são questões para nós professores também atentarmos. Não somos os donos do saber. Não entramos em sala de aula para transmitir conhecimentos aos aprendizes. Entramos lá para estimular processos cognitivos que farão com o que o aluno, por suas próprias deduções, cheguem ao resultado. Somos apenas facilitadores, que, muitas vezes, em vez de facilitar, dificultamos tudo e tornamos a vida dos nossos alunos um inferno. Pais e professores, pensemos juntos nisso.

6 comentários:

@biacopini disse...

Isso me fez lembrar de um episódio um tanto quanto bizarro da minha vida. Certa vez perdi um ponto na prova por ter ido bem demais. O professor (do qual nem me lembro o nome) alegou que eu "poderia" ter colado e resolveu me punir por sua desconfiança.

Didática 0 pra ele.

André disse...

Concordo. Eu ouço um discurso de que "aluno é bicho ruim", "aluno não se esforça". Claro que há alunos que realmente não se esforçam, mas ao invés de só apontar culpados, deve-se aprofundar. Quais são as (faltas de?) motivações de um aluno que não se interessa ou não é bem sucedido? Além disso, por que os professores não têm a humildade de admitir que podem estar aplicando uma metodologia errada?
A arrogância da "máquina de aprendizado" pode ser uma resposta.

Gabriella Guedes disse...

Que escola é essa onde os pais só responsabilizam os filhos/alunos? Realmente muito diferente das que eu conheço, onde os alunos/bebês nunca têm responsabilidade pelos seus atos. Concordo com o que você diz, apenas aplicado em uma realidade diferente. como sempre, o que precisamos é do equilibrio entre as duas situações. Difícil é reconhecer e procurá-lo.

Maranganha disse...

Isso me faz lembrar que não existe aluno preguiçoso, o que existe é sistema educacional que não supre as necessidades daquele aluno.

Jotapê disse...

Ontem mesmo na Unipe, uma interpretação errada, ou desencontro de informações entre um aluno "EU", um professor, fizeram com que ele antecipasse uma prova. Reclamamos, mas " O Professor tem Sempre razão" e " O aluno sempre tem a culpa , então...

Gostei desse

Bruno Ribeiro disse...

Acho que com Steven Jobs essa de "aluno preguiçoso, ruim, etc", caiu por terra!